Atualmente, em todo o mundo, mais de 600 milhões de adultos e 300 milhões de crianças e adolescentes em idade escolar são obesos. Esses são dados da Unicef do ano passado e, segundo a mesma organização, a estatística deve permanecer em torno desse número pelos próximos anos. O Brasil tem 56,5% de sua população com sobrepeso, 22,1% com obesidade, e a pandemia de coronavírus vem atraindo bastante atenção também no que se refere a este assunto.
E não é para menos. Índices de massa corporal elevados mostraram ser um importante fator de risco para o desenvolvimento de sintomas graves de covid-19. Pesquisa recente da Federação Mundial da Obesidade apontou números bem preocupantes: entre 2,5 milhões de mortes causadas pelo novo coronavírus, 2,2 milhões ocorreram em países com altos índices de obesidade.
Outra situação que agrava ainda mais esse cenário é o estigma em torno do tema, já que pessoas com obesidade são mais relutantes em procurar atendimento médico, incluindo as vacinas. Para superar esse estigma, precisamos entender melhor as verdadeiras causas da obesidade, nos concentrar em tratamentos bem-sucedidos e combater a desinformação galopante sobre esse problema de saúde comum. Acompanhe:
Mito: a obesidade resulta de escolhas de estilo de vida
Muita gente pensa que o índice de massa corporal (IMC) de pelo menos 30 é um reflexo de más escolhas de exercícios e dieta. Mas não é bem assim: pesquisas mais atualizadas indicam que as causas são complexas e não podem ser explicadas apenas pelas calorias que você ingere ou quantidade delas que você queima durante o treino. A absorção de calorias varia entre os indivíduos e é determinada não apenas pelo tamanho da porção na hora das refeições, mas também por fatores como micróbios intestinais, hormônios, enzimas digestivas e sinais nervosos. Neste jogo, o metabolismo é um competidor importante. E há evidências crescentes de que genética, privação de sono, medicamentos, estresse e até mesmo o ambiente ao qual uma pessoa foi exposta no útero podem contribuir para um ganho de peso prejudicial à saúde.
Mito: Ser ou não ser uma doença, eis a questão
Não é verdade a afirmação de que obesidade não é doença. Tudo começou anos atrás a partir de uma decisão da American Medical Association contra as recomendações de seu próprio Council on Science and Public Health. Os membros do conselho não acreditavam que ela podia ser enquadrada na definição de doença – na verdade, eles achavam que essa classificação teria pouca relação com o tratamento e temiam que isso resultasse em uma diminuição da responsabilidade pessoal. E assim nasceu o mito.
Mas a obesidade é, sim, uma doença, porque resulta em “comprometimento do funcionamento normal de algum aspecto do corpo”. Pessoas obesas têm adiposopatia, ou “gordura doente”, que contribui para respostas anormais das glândulas e do sistema imunológico, resultando em um risco aumentado de diabetes, pressão alta, colesterol alto e doença hepática gordurosa. Essa resposta imune anormal responde ao porquê de obesos estarem entre os grupos de risco para a covid-19.
Mito: boca fechada e corpo em movimento – e apenas isso – revertem a obesidade severa
Há evidências cada vez mais fortes de que dieta e exercícios sozinhos são geralmente ineficazes na redução e manutenção de um IMC mais baixo, particularmente para pessoas com obesidade grave, definida como um IMC de 40 ou mais. Na verdade, a perda de peso faz com que a fome aumente e o metabolismo desacelere, o que pode levar à recuperação do peso. Os medicamentos podem complementar a dieta e os exercícios para permitir que os indivíduos com obesidade grave melhorem sua saúde. Outro tratamento eficaz é a cirurgia para perda de peso, que também resulta em alterações metabólicas do corpo que diminuem significativamente o risco de doenças cardíacas e diabetes.
Mito: neném gordinho e cheio de dobrinhas é sinal de saúde
Como a primeira infância é um período de rápido crescimento e desenvolvimento, muitas vezes presume-se que crianças pequenas que são obesas não permanecem obesas. Embora a obesidade infantil nem sempre resulte em obesidade na idade adulta, a maioria das crianças não supera o problema de peso. Apenas cerca de 17% das crianças obesas ou com sobrepeso e em idade pré-escolar voltam ao peso normal no momento em que começam o ensino médio, revelou um estudo de 2015 da Clinical Pediatrics. Outros estudos mostram que a obesidade infantil é um importante indicador de que uma pessoa se tornará um adulto obeso. Em comparação com a obesidade de início na idade adulta, as consequências da obesidade que começa na infância podem ser mais graves porque a criança tem a doença por mais anos, levando a consequências mais adversas para a saúde.
Mito: Perder peso muito rápido aumenta suas chances de recuperar o peso rapidamente também
Fique tranquilo, isso só vai acontecer se você seguir métodos de dieta pouco saudáveis. Por exemplo, se perder peso como resultado de pular refeições e passar fome por alguns dias, você terá maior risco de recuperar o peso como resultado de flutuações hormonais e outros fatores que podem fazer com que você coma demais. No entanto, se você está perdendo peso rapidamente como resultado de trabalhar duro para se alimentar de maneira saudável e se exercitar, continuará a perder peso enquanto for consistente.
São inúmeros os desafios a serem superados para garantir que as pessoas obesas tenham acesso a cuidados médicos e apoio para um controle eficaz e livre de preconceitos. Apesar do crescente reconhecimento como uma doença crônica, séria e progressiva, muitas barreiras – inclusive sociais – para um tratamento eficaz ainda permanecem. Essas barreiras se refletem na interação insuficiente entre pacientes e profissionais de saúde e no diálogo que abre espaço para novos mindset e ao tratamento da obesidade.